Um olhar sobre os programas de Lula e Bolsonaro
2/9/2022
Faltam 30 dias para 2/10 e são 120 dias de reflexão. Vamos à comparação entre os programas Lula/Bolsonaro no tema da corrupção. Amanhã serão os de Ciro e Tebet.
O programa da coligação Brasil Esperança está organizado na forma de compromissos públicos, caracterizando pela fragmentação e pela falta de detalhamento do “como”. O termo corrupção aparece 5 vezes e repete o que o candidato tem falado: combate pela atuação independente e autônoma dos órgãos de controle e compromisso com o restabelecimento de práticas republicanas nesses órgãos, de forma a coibir ações contaminadas com vieses políticos (itens 111, 112, 113 e 114).
No item 15, encontro algo de que gosto muito: “É preciso uma reforma do Estado, que traga mais transparência aos processos decisórios, no trato da coisa pública de modo geral, direcionando a esfera pública e a ação governamental para as entregas públicas que realizem os direitos constitucionais dos órgãos de controle, das promessas de transparência”. Ainda que embrionária, aparece aqui a sinalização de entendimento da limitação dos instrumentos que vêm sendo utilizados. Mas é pouco, é preciso envolver mercado e sociedade civil. Senão, não vai andar.
O programa da coligação Pelo Bem do Brasil tem formato de “planejamento estratégico”. É possível ter clareza de a ideia de país que essa corrente defende é a que vimos nesses 4 anos, revestida de argumentos para tentar nos convencer de que é algo bom. O termo corrupção aparece 13 vezes. Será que é sinal de que eles são mesmos “do bem” como propagam?
Se você, até essa idade, ainda coloca o sapato na janela para o presente do “Papai Noel” ou acredita na “mão invisível de mercado para equilibrar as demandas de sociedade e interesses do mercado, a resposta à pergunta pode ser sim. Do contrário, duvide e muito. A corrupção aparece na introdução e no item Governança e Geopolítica, que apresenta como temas: a) promoção da integridade; b) valorização do servidor; c) Transparência; d) Ética; e) monitoramento da gestão. A introdução é um ótimo indicativo do que vamos encontrar pela frente.
Com dados sobre pobreza e linha da miséria questionáveis, o programa traz dois esquemas: 1 que reflete o que vinha sendo feito nos governos anteriores (denominado ciclo da pobreza) e o outro, o que foi feito a partir de 2019 (denominado ciclo da prosperidade). O primeiro tem 3 caixinhas a mais: trabalho, social e corrupção. No segundo, oportunidade em lugar de trabalho e arrecadação/riqueza no lugar de imposto. Esses esquemas me fizeram lembrar que, em final de 2018, eu estava na Europa e conversava com um cientista político que tinha relações com o Banco Mundial. Ele me confidenciou o Banco Mundial conversa sempre com as equipes econômicas de candidatos a presidentes e que um amigo dele do Banco teria dito ter ficado impressionado com o desconhecimento da equipe do Guedes sobre o setor público. Eu penso que é disso que se trata A argumentação utilizada na introdução cita um monte de coisa que não faz o menor sentido. Mais ou menos na mesma linha do candidato, quando diz que ao armar a população reduziu as mortes violentas no Brasil.
Como especialistas consideram que ele liga “lé com cré”, podemos sinalizar que o programa utiliza dados questionáveis com modelos tirados da cartola, para reafirmar a mitificação com o poder do mercado (oportunidade/arrecadação) e a demonização do “social”, entrincheirado entre o trabalho e a corrupção. Quanto aos subitens do item Governança e Geopolítica, penso que eles apresentam o mesmo problema do programa da outra coligação, com a diferença de trazer em mais detalhe o que existe de processos de prevenção e combate à corrupção, especialmente os da Controladoria-Geral, órgão criado pelo governo Lula. Penso que a proposta é, em si, uma peça de corrupção do terceiro nível, pois propositadamente tenta confundir o eleitor para angariar vantagens pessoais.
Podemos perceber que, como nos debates, os dois programas indicam que o campo da política parece ainda não vislumbrar possibilidades de fomentar um processo efetivo de superação da corrupção de que falávamos ontem.