Candidatos e a dificuldade de falar de corrupção com propriedade
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Faltam 31 dias para 2/10 e são 119 dias de reflexão. Hoje respondo à pergunta de ontem sobre como vi os candidatos, no debate do dia 29/8, em relação ao tema da corrupção.
Lula - não conseguiu enfrentar o assunto, optando por não responder diretamente sobre os escândalos de corrupção que ocorreram durante os governos do Partido dos Trabalhadores ou da acusação de estar diretamente envolvido. Considero que o Lula e o PT, mais que qualquer outro partido, precisam fazer um enfrentamento ao tema porque o Mensalão e a Lava-Jato trazem uma imagem negativa à própria esquerda. Não há outro caminho a percorrer a não ser admitir os escândalos, mostrar que pessoas foram punidas e, também admitir que o fortalecimento dos órgãos de controle foi insuficiente para que o país avançasse no controle da corrupção. Além disso, é necessário mostrar que o Brasil convive com esse problema desde sempre, inclusive na atualidade, como demonstram cotidianamente os jornais. Os indicadores de controle da corrupção, tais como os do Banco Mundial, mostram que andamos de lado desde o início da série histórica (1975). A população precisa conhecer os limites de um dirigente - presidente, governador, prefeito – e, também de seu staff de controle, para resolver o problema, não resolve. Os órgãos de controle são necessários, mas têm efeito muito limitado para processos de mudança. Para isso, é necessário lançar mão de estudos que avaliam como fizeram os poucos países que venceram esse desafio da corrupção. A resposta pode estar em ver a questão como problema de sociedade, o que demanda um pacto amplo e verdadeiro de mudança.
Bolsonaro
Não enfrentou as acusações de corrupção que foram feitas por Ciro e por Simone. Ciro trouxe acusação de corrupção do deputado, de envolvimento de esposa, ex-esposa e filhos. Tebet falou das denúncias de corrupção no Ministério da Educação e no Ministério da Saúde. Também foram trazidas ao debate questões de corrupção de segundo nível, tal como a denúncia de interferência nos órgãos de controle e polícia federal. Esqueceram de citar a devastação nos mecanismos de controle social que foram constituídos nos governos do PSDB e, especialmente, do PT. Tudo isso corrompe a capacidade de funcionamento das instituições democráticas. Como corrupção de terceiro nível foi dito nas entrelinhas pelo Lula, que Bolsonaro se elegeu em 2018, utilizando como força o sentimento anticorrupção derivado da Lava-Jato, agravada pelo uso indevido da máquina pública para que fins ideológicos. Deu no que deu. Ao final, o juiz foi julgado parcial e todo processo contra o Lula anulado. A própria Operação Lava-Jato e a luta de enfrentamento da corrupção sofreram reveses significantes. Mas o candidato aposta que pode reacender o antipetismo e continua se dirigindo ao Lula, de forma desrespeitosa ao Supremo. Com isso ele corrompe por dentro a força das instituições, colocando em xeque a legitimidade do Estado Democrático de Direito.
Ciro conhece tudo isso muito bem. Sem cargos executivos há tempos, ele não tem como ser alcançado por acusações de corrupção, em especial do primeiro nível. Mas ele faz o jogo da corrupção do terceiro nível, ao utilizar o tema para a disputa política em proveito próprio (ainda que mais controlado do que o Bolsonaro). Ele sabe que a corrupção no Brasil é sistêmica e ele surfa na Lava-Jato para disputar os votos com o PT. Como disse Reinaldo de Azevedo ontem, no seu programa “É da Coisa”, o Ciro é advogado. Ele sabe que um processo anulado é mais amplo do que o julgamento de inocência. Portanto ele sabe que Lula passou à condição de inocente com a decisão do Supremo. Ainda assim, ele joga um jogo sujo ao discordar quando o Lula afirma que está inocentado. Não joga limpo, ele sabe disso e escolhe tratar o tema na superfície, encobrindo o mundo real da corrupção no Brasil.
Simone Tebet também conhece tudo isso e, também, é advogada. Penso que ela não fez um jogo limpo quando ela jogou para cima do Bolsonaro o orçamento secreto, sendo que ela própria foi uma senadora que votou a favor da criação disso que ela chamou da maior corrupção já praticada no Brasil. E é mesmo. Somente este ano, são 10 bilhões de reais e, no próximo ano, 16 bilhões.
Então, tudo isso não é para ficarmos deprimidos e dizermos que o Brasil não tem jeito. Precisamos é de um outro jeito de enfrentarmos esse problema. Podemos, por exemplo, aproveitar a eleição para desafiarmos os candidatos a terem a coragem de fazer um enfrentamento mais apropriado e amadurecido desse tremendo desafio que nos prejudica muito e que, infelizmente, ameaça o bem-comum na maioria dos países do mundo.
Na minha forma de pensar, considerando apenas a abordagem dos candidatos no debate, a avaliação seria zero para todos. Lembro que Bolsonaro somente passará a receber nota se mudar de postura em termos de compromissos com o zelo pelo Estado Democrático de Direito. Ele não atingiu o mínimo de pontuação no primeiro indicador que era eliminatório.